Entidades do agronegócio intensificaram a articulação para que o governo federal reveja o Plano Clima, documento que deve guiar a política brasileira de mitigação e adaptação às mudanças climáticas até 2035 e que está previsto para ser apresentado em novembro, na COP30, em Belém (PA).
Apresentada em 18 de agosto, a versão final do plano foi elaborada pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) — chefiado pela Casa Civil e composto por 23 ministérios — após consultas públicas iniciadas em 2023. O texto estabelece metas para vários setores com o objetivo de reduzir entre 59% e 67% das emissões líquidas de gases de efeito estufa em relação a 2005, em linha com as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) assumidas no Acordo de Paris.
No dia seguinte à divulgação do documento, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) classificou o plano como “autossabotagem”. O presidente da bancada, deputado Pedro Lupion (PP-PR), disse que o texto compromete a imagem internacional do agro ao atribuir ao setor a maior parte da responsabilidade pelo problema climático.
Segundo a FPA, a proposta impõe ao campo a obrigação de cortar até 54% das emissões até 2035, enquanto permite ao setor de energia aumentar seus lançamentos em até 44% no mesmo período. Além disso, mais de 800 milhões de toneladas de CO2 equivalente oriundas de desmatamento — inclusive em assentamentos e territórios tradicionais — são atribuídas à agropecuária, superando as emissões produtivas propriamente ditas (643 MtCO2e).
O setor também contesta o uso de dados considerados não oficiais, como os do MapBiomas, e reclama da ausência de contabilização de remoções de carbono obtidas por áreas de preservação permanente, reservas legais, biocombustíveis e bioinsumos.
A Sociedade Rural Brasileira (SRB) divulgou manifesto pedindo que a publicação do Plano Clima seja adiada para novo debate. A entidade afirma que o texto transfere ao agro as emissões de desmatamento em propriedades rurais, alterando a metodologia adotada pelo Inventário Nacional de Emissões de Gases de Efeito Estufa.
Outras organizações — Abisolo, Abiogás, Cecafé e Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) — enviaram contribuições com a mesma preocupação. Durante audiência no Senado, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) defendeu maior participação do Congresso na definição das metas, alegando falta de transparência na forma como o governo distribuiu a responsabilidade setorial.

Imagem: Jonathan Campos via gazetadopovo.com.br
A Mesa Brasileira da Pecuária Sustentável, que reúne mais de 60 entidades da cadeia, propôs ajustes para evitar interpretações equivocadas. Entre as recomendações estão:
- divulgação dos dados e metodologias usados no cálculo das emissões;
- reconhecimento de práticas já adotadas, como recuperação de pastagens e integração lavoura-pecuária-floresta;
- inclusão das remoções de carbono no solo geradas por restauração de vegetação nativa;
- medidas específicas para agricultura familiar, com crédito e assistência técnica;
- metas intermediárias em 2032 e 2034 para monitorar o progresso;
- uso da plataforma AgroBrasil+Sustentável como ferramenta de acompanhamento;
- reconhecimento oficial de tecnologias que reduzem metano, com financiamento à sua adoção.
Diante das críticas, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) divulgou nota afirmando que o Plano Clima segue as metodologias do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) e que as emissões foram redistribuídas por responsabilidade setorial. Segundo a pasta, o setor agropecuário engloba não só atividades produtivas, mas também mudanças no uso da terra em propriedades privadas, assentamentos da reforma agrária e territórios quilombolas.
O MMA destacou que as projeções de remoção de carbono utilizam dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), de forma cautelosa, e que trabalha com a Embrapa e especialistas para aprimorar a contabilização nos próximos inventários.
Até o momento, representantes do agronegócio mantêm a pressão por alterações ou adiamento do Plano Clima antes de sua apresentação oficial na conferência da ONU.
Com informações de Gazeta do Povo